quinta-feira, março 20, 2025

Na praia

 




Todos estão confusos. Sentem-se vazios... A vida sem a presença do mestre Jesus os deixava com a sensação de não saber ao certo o que fazer.

Dentre eles, Pedro tinha o coração ainda mais dolorido. É difícil enfrentar a realidade de ser menos, quando se pensou, ser mais. Pelo mestre, acreditou que conseguiria dar a própria vida. Mas, como todos os outros, o negou.

Naquela noite, sentindo um peso no peito frente ao futuro que nada o acenava. Ele disse, ‘vou pescar’. Os outros discípulos que estavam na praia juntaram-se a ele. Afinal, eram homens do mar, antes de andar com o mestre. E como também não sabiam como recomeçar, fazer o que se sabe podia ajudar a encontrar de volta o caminho.

Eles pescaram a noite toda. Nenhum peixe apanharam. Exaustos e com fome, retornam à praia ao amanhecer, ainda mais confusos... vazios...

Mas, o mestre Jesus estava na praia. Contudo, os sentimentos confusos, ansiedade quanto ao futuro, a fome presente, o cansaço de lutar e nada ter, roubaram deles ver o que tanto precisavam. Eles não o reconheceram.

Mas, Jesus estava na praia naquele amanhã, em que a esperança, parecia uma fumaça a se perder no tempo.

Não se esqueça.

Naquela manhã, Jesus estava na praia.

Psiu... vou repetir:

Naquela manhã, Jesus estava na praia.

Roseli de Araújo

Escritora e Psicóloga


(texto baseado em João 21 e publicado a primeira vez no dia 11/04/23)

quinta-feira, março 13, 2025

Carta a um pai (texto cedido por uma paciente)


                  Foto do site:  https://funerariasantacasa24h.com.br/como-superar-a-perda-de-um-pai/

Sinto saudade de você pai, ainda que esteja aqui. Saudade do riso de graça, dos passeios nos rios, das viagens esperadas com paradas para lanche, dos doces quando chegava do trabalho, da cantiga do serrador, das rodas com violão e sanfona.                

Por vezes, me vejo procurando-o. Para onde foi mesmo? Não o encontro mais. Então percebo que todas as minhas lembranças ficaram perdidas no meu mundo da infância.  E pergunto a mim mesma, o pai da infância onde esta?

Agora, confesso não gosto muito, hoje, do que faz. Não quer mais uma conversa de mão dupla, e tem como único assunto a si mesmo. Não traz mais os doces, antes cobra até o que já tem. Não mais reúne rodas de pessoas, agora vive isolado na sua caverna. Não senta a mesa nem mesmo em dias de festas, preferindo, na maioria das vezes, seus programas na televisão... E fico com a impressão que se perdeu do mundo dos afetos.

Hoje, também, já com cabelo brancos a tingir minha cabeça, muitas vezes, escuto minha criança a reclamar a saudade do pai.  E uma dor emerge ao sentir que o afeto se dissipou com o tempo.

Todavia, sei que nem tudo que sinto é uma verdade. Somos o que conseguimos ser. E reconheço que me deu muito além do que recebeu dos seus pais. E, tenho orgulho de ser sua única filha.

Então, calo minha criança, ao reconhecer que ainda é meu pai do jeito que sabe ser. E do seu jeito, ainda foi, é e sempre será, o pai que preciso.

(Texto de uma paciente)


quinta-feira, fevereiro 20, 2025

O passarinho e o meu guarda roupa

 



Era uma manhã bem tranquila. Eu estava lendo, quando de repente um barulho me assustou. Olhei e vi um passarinho no chão. Ele havia entrado voando e bateu na porta do guarda-roupa.

Aproximei com a intenção de ajudá-lo, e ao me ver tentou voar, mas estava desnorteado, e sem conseguir, desistiu de lutar.

Ao ver que nada tinha quebrado, o aconcheguei em minhas mãos, ele se aquietou. Eu fiquei ali encantada com aquele pequenino tão frágil em minhas mãos.

Sua visita tão desajeitada me fez pensar que, na vida, muitas vezes, em decisões que tomamos, batemos em muitas portas de guarda-roupas.

Pensando estar na direção e na velocidade certa, ficamos desnorteados quando nos defrontamos com barreiras que são intransponíveis.

É impressionante como decisões erradas têm o poder de nos paralisar, nos levando, muitas vezes, a nos impor uma jornada solitária e recheada de medos. Decepcionados em não perceber as barreiras antes, nossa tendência é pensar: Como não vi o guarda-roupa? Como não medi a distância certa? Por que fui tão rápido? E são tantos os porquês que nos atormentam...

Decisões erradas nos levam a ficar desconfiados da nossa capacidade. E como aquela criança que passou a ter medo da janela porque um dia pulou, por pensar ser um super-herói e quebrou a perna, assim somos nós, passamos a ter medo de errar e cremos que só vive bem quem nunca erra. Todavia, esta crença pode nos quebrar a alma.

Não sei onde aprendemos que devemos acertar em tudo. A verdade é que a vida nem sempre sinaliza as curvas, os abismos, as fronteiras, e é preciso caminhar para aprender o caminho.

Temos que aceitar que viver é decidir. E que depois de certas decisões podemos experimentar a sensação de que, de agora em diante, ‘o daqui para frente é só para trás’. Porém, este sentimento deveria servir para ficarmos quietos até entendermos onde foi que erramos, para então corrigirmos a rota à nossa frente. Todavia, muitas vezes ficamos como aquele passarinho, amuados e desconfiados de qualquer um que se aproxima com suas mãos estendidas.

Aquele passarinho, eu o levei ao pé de pitanga, que fica de frente à janela do meu quarto, e o coloquei em um galho. Ele ficou quietinho por alguns minutos, depois se sentiu seguro e, quando voltei lá, já tinha voado.

Confesso. Fiquei feliz em tê-lo ajudado a voltar ao seu propósito.

Eu creio que assim o Senhor faz conosco.

Quando ficamos desnorteados e sem conseguir lutar, Ele nos leva para pitangueira da nossa vida e nos coloca num galho seguro. Ele não fica levantado os porquês dos nossos erros. Ele deseja que a gente fique apenas um pouco de tempo quieto, para percebermos o que Ele fez e tem feito por nós. Tempo só para refletir e pedir perdão por um dia termos confiado que não iríamos errar. Tempo apenas para perceber que Ele estende as mãos para gente como eu e você. Tempo para ver que em Cristo somos perdoados. Tempo para podermos encontrar nEle a segurança perdida e voltarmos a voar na direção do seu propósito.

Creia, Ele se alegra quando você volta a voar.

Roseli de Araújo

Escritora e Psicóloga clínica

 

 

domingo, fevereiro 09, 2025

A vida sempre triunfa

 


Quando algo por dentro já não é o mesmo, tudo muda.

Desde que minha mãe partiu, sinto que não sou mais a mesma. Até o ambiente já não parece ter as mesmas cores. A casa dela, a qual, hoje, eu moro, já não a reconheço. E o que era tão familiar agora parece estrangeiro.

Um dia depois do seu enterro, ao acordar, uma sensação de estar perdida me invadiu por inteiro. Pensei, e agora? Fiquei deitada ali, buscando dentro de mim razões para poder levantar. 

Impressionada com a roda da morte que parecia ter atropelado muitos dos meus olhares para a vida, sai da cama. Naquela manhã, eu tinha agendada uma sessão de psicoterapia. E ao abrir o computador, sabia o que compartilhar com minha psicóloga. Ao terminar a sessão, entendi que minha mãe, embora tivesse partido, seguia dentro de mim. Então, agora, presente apenas em mim, a forma de me relacionar com ela mudou para sempre. E ao compreender o que mudou, vi que tinha chão para seguir.

De vez em quando, me pego conversando com minha mãe. Pergunto: Por que foi tão cedo? Às vezes, digo para ela: sua casa perdeu a alegria sem suas risadas. No início, sentia que não estava certa ao conversar com ela. Mas aprendi que converso com a mãe que ficou em mim.

A verdade é que tenho aprendido com as pessoas que já perdi que sempre vou amá-las. Embora o amor que nos uniu me tornou vulnerável e trouxe muita dor quando partiram, sei que a vida teria sido vazia sem o amor por elas.

Esse saber calou e cala a minha alma, mergulhando-me num silêncio que se tornou a minha mais confortável poltrona.

Sim, a morte é muito dura. Ela bagunça a nossa vida por inteiro. Contudo, mesmo atropelando nossos olhares pela vida, ela nunca será maior que a vida recheada de amores.

A Deus toda a gratidão pelas pessoas que amei, amo e amarei.

Roseli de Araújo

Escritora e Psicóloga clínica

sábado, fevereiro 01, 2025

O último documento

 



Naquela fila de espera, para retificar o meu nome que estava errado na certidão de óbito de minha mãe, olhei ao redor e o cartório me pareceu frio e sem alma. 

Ao segurar aquele documento sem querer, me deparei com o que já sabia: Nada aqui é meu, nem mesmo o meu último documento. Ali, experimentei a dura realidade deste mundo capitalista, onde até a dor se torna mercadoria.

Este pensamento fez com que um misto de sentimentos me vestisse por inteiro. Tive que respirar fundo para conter as lágrimas diante dessa vida tão cara, e, ao mesmo tempo, tão sem valor.

Transtornada por dentro, mas por fora aparentemente calma, fiquei a remoer por que o TER na maior parte do tempo, é o senhor da nossa agenda? Se nada levaremos, nem mesmo aqueles objetos que guardamos ao longo da vida com tanto carinho, por que nos preocupamos em gastar nosso tempo acumulando bens que ficarão para outros desfrutarem? Ou desfazerem sem nenhum sentimento? Qual é a agenda que vale a pena viver? 

Enquanto este questionamento, como um gigante sem piedade me arrastava para um caos interno, me lembrei da agenda de Jesus ‘quando deixou a Judeia e retirou-se outra vez para a Galileia, porque era-lhe necessário atravessar a província de Samaria’1 e encontrar uma mulher que não era bem-vista pela sua comunidade por ter ‘tido 5 maridos, e estar no seu sexto relacionamento sem se casar’2.   

Também me lembrei do encontro com seus discípulos, com a mulher adúltera, com o gadareno, com os muitos doentes que curou, com as multidões, com jovem rico, com Zaqueu, com a mulher que lhe tocou, com a mulher sírio-fenícia, com o centurião, com Lázaro, Marta e Maria, e tantos outros3. De fato, ‘Ele se fez carne para habitar entre nós’4. Ele veio para buscar e salvar o perdido5. Ele veio para encontrar pessoas como eu e você. Ele não gastou sua vida acumulando tesouros como costumamos fazer.

Uau! Que agenda complicada e ao mesmo tempo fantástica.

Sentada ali naquele lugar que teimava em congelar minha alma, fui aquecida e desafiada pela agenda de Jesus. Ela é capaz de dar sentido a tudo. Até mesmo ao meu último documento que não será meu, e sim dos meus.

Saí daquele cartório de cabeça erguida, não precisando conter o sorriso que brotou em mim.

Roseli de Araújo

Escritora e Psicóloga clínica

            

                Referência bíblica:

1.                                    1. Evangelho João 4:3,4;

2.                                    2. Evangelho João 4:18;

3.                                   3. Os evangelhos de Mateus, Marcos, Lucas e João;

4.                                    4. Evangelho de João 1:14;

5.                                    5. Lucas 19:10

 

segunda-feira, janeiro 06, 2025

 


2025.

Vasculho. E fico sem encontrar dentro de mim nenhuma pergunta para este início de ano. Parece estar claro o que deve ser feito.

Percebi que não preciso de novos planos. Antes, careço de rever com cuidado os velhos e avançar neles.

E a palavra que me desafia diante do que ainda não foi feito, é sempre a velha e boa disciplina. Não sei você, mas assusto-me com o quanto é fácil compreender sua importância, tanto quanto é difícil de fazer dela, o feijão com arroz, de todo o dia.

A verdade é que a impressão que tenho é que são muitos os leões para serem mortos em um só dia... E o passar dos anos tornou muitos deles ainda mais difíceis de serem vencidos. Entretanto, ao fitar a arena da vida, descubro que a primeira ação que desejo não é mais matar leões.

Sinto precisar mais, muito mais, de erguer os olhos.  Fitar os céus. Matar minha velha natureza e alinhar meu coração com a boa, perfeita e agradável vontade do Pai1.

Não estou aqui a defender uma vida sem alvos. Longe disso!

O que desejo é aprender com a morte, esta professora implacável, a passar a página de projetos fúteis e remir o tempo, de forma que a minha vida se revista do que é eterno.

2025.

Meu anseio é tarefa árdua. Contudo, sei que não estou sozinha.

 

Escritora e Psicóloga

Roseli de Araújo

 

Referência:

1.     Romanos 12:1

sexta-feira, novembro 29, 2024

Tempos

 

          


Como um adulto que esqueceu por completo sua infância, o tempo não brinca de dá tempo.

Acordamos e o dia parece correr. O final do mês chega. Meu Deus!!! Já é fim de ano. E o tempo corre sem fazer curva, enquanto nós o vivemos dentro do nosso próprio ritmo. Por vezes, um descompasso se instala. Mas, o tempo não negocia paradas.

Neste tempo, que minha mãe partiu, eu estou aqui tentando reorganizar a casa. Descobri que embora ajude a demarcar o novo ciclo, o que eu trago por dentro é o que precisa ser mais uma vez reorganizado. O estranho é que nada é mais como antes, enquanto muita coisa segue do mesmo jeito.  E sem saber dimensionar o tudo que mudou, percebo a presença de sentimentos novos, nesta casa vazia que hoje jorra a saudade dela.

Na minha busca de lidar com o que sinto, faço amizade com o tempo. Descubro que o tempo é o único que lida com dores que só ele pode carregar. E mesmo sendo este adulto que não gosta de brincar, de dar de si, me carrega em sua viagem sem descanso.

E sigo consolada. Alegrando-me na experiência de ser abraçada pelo meu senhor e salvador Jesus.

Sei que ele é o Senhor do tempo. Ele voltará e o seu povo será reunido com ele1. Ele é o que cria o tempo certo para cada propósito2. Ele é o porto no qual estou ancorada.

Embora este tempo, é tempo de lágrimas que correm sem pedir licença, por vezes me incomodando por não conseguir contê-las, bem sei que nenhuma cai sem a viva esperança a bater no meu peito.

E faço como Jeremias diante de uma dor que sangra, trago a memória o que pode me dar esperança3.  E vivo as palavras de João, o apóstolo, que a vitória que vence o mundo, é mesmo a nossa fé em Cristo4.

A Deus toda glória pelo consolo.

Roseli de Araújo

Escritora e Psicóloga clínica

Referências bíblicas:

1. Apocalipse 22:

2. Eclesiastes 3:1;

3. Lamentações de Jeremias 3:22

4. IJoão 5:1-4

 

 




  

quinta-feira, junho 27, 2024

o que nos rouba a crítica?




               Dizem que existem críticas construtivas. Eu creio. Mas, não sei você, eu as escuto muito pouco.

O que percebo é a constante presença de críticas pequenas e sutis, como cupim em madeira. Um comentário aqui, outro acolá... E de repente, o que pareci tão bom ficou mais ou menos; o mais ou menos, ruim; e o ruim, sem solução; e a casa cai, relações se desmoronam.

O mais terrível é que as críticas que fazemos, na maioria das vezes, não passam de tempo perdido que gastamos com assuntos, os quais, não movemos nenhum dedo para mudar. E o tempo não brinca, antes corre sem nos esperar.

Confesso. Não sei se a crítica leva a paciência embora, ou se a falta de paciência promove a crítica. Todavia, tenho certeza que se alguma paciência for exigida no caminho, a crítica vai destruí-la, por completo.

O grande problema que nem sempre nos damos conta é que ao criticar podemos revelar que somos como aquela mulher que falava das roupas sujas estendidas no varal da vizinha, esquecendo-se de que não havia lavado suas janelas. Tudo que podemos estar fazendo é falando de nós mesmos: nossa omissão, nossa arrogância, nossa falta de sabedoria. Então, por que seguimos cultivando-a como uma bela rosa no jardim?

Desconfio que a crítica pode ser parte da nossa eterna luta para ser melhor em alguma coisa. Vivemos o medo (creio que na maioria das vezes inconsciente) de sermos muito menos do que poderíamos ser. E a crítica pode ser um caminho fácil e rápido para nos fazer sentir especiais.

Todavia, o pior das críticas é o que se perde: o melhor das pessoas. Enquanto, o outro perde o melhor de nós. E como é triste ver relações preciosas ou que poderiam nascer serem totalmente arrasadas.

Mas, não precisamos nos manter neste caminho. Jesus mais uma vez nos deu a direção para nos livrarmos desta sutileza que torna a vida azeda. Ele nos diz para não julgarmos1, deixarmos de lado o que pensamos que estamos vendo, andarmos com outro - muitas vezes em silêncio - para compreendê-lo.

Fazendo assim, a vida segue com a possibilidade de ser vivenciada em seu maior encanto: O encontro com o outro.

Sem as críticas pequenas e sutis que não levam a nada, Jesus nos ensina a construir um mundo onde a vida tem espaço para brotar, crescer e florescer.

Roseli de Araújo

Escritora e Psicóloga clínica

Referência:

1. Mateus 7:1-3

 

quinta-feira, junho 06, 2024

O jardim e a insatisfação

Depois que o jardim que plantei floresceu, sempre que possível, sento na garagem para tomar café, curtindo sua beleza. E, nesta semana que passou, numa tarde, encantada com as flores lilás com o miolo branco, fotografei na esperança de registrar a beleza que estava vendo, mas a câmera não captou. Chamando minha atenção a diferença entre as flores que eu via e a foto delas, fiquei ali pensando na vida...

E me dei conta de que, nestes últimos dias, eu estou como aquela câmera que não consegue captar toda a beleza que sei que há em minha vida. Talvez por isso, uma insatisfação sorrateira tem se instalado em meu peito.

Digo em minhas orações: Obrigada Pai, por tudo, mas, na verdade do íntimo, eu pergunto: por que certas respostas nunca chegam? Por que temos que lutar diariamente, por anos, com os mesmos problemas? Por que parece que em algumas áreas não avançamos?

Percebi que é grande a batalha para não deixar a insatisfação instalar quando minhas expectativas são frustradas. E, mais acirrada, se torna quando se reveste de uma espiritualidade superficial, onde resisto a não visitar minha verdade.

Não é fácil lutar com o que está dentro, e sentada frente ao meu jardim, vi minha alma tentada a se dobrar ao peso de não encontrar as respostas.  Assustei-me com o quanto meus olhos podem se tornar maus, levando-me a experimentar as trevas1.  Ansiedade, estresse, depressão pode se tornar uma realidade, se eu não deter esta insatisfação que faz meus olhos não ver a beleza da vida que já recebi.

A verdade é que não ver o belo cansa e amarga a alma.

Cansada, corro o risco de parar e perder o que não para (o movimento de Deus na terra). Amarga, contamino a muitos, desanimando-os pelo caminho. Que tragédia!!!

Na busca de não me afundar em minhas insatisfações, percebi que minha maior tentação é ir em busca de estratégias, métodos, projetos, sonhos sem desfrutar do que já tenho em Cristo.  E descubro que nada é mais miserável do que isso.

Pois, nEle, somente nEle, os rios de águas vivas correm. É nEle que devo permanecer para desfrutar de tudo o que já conquistou para mim. É nEle, que o propósito é certo, e nada pode me tirar deste caminho. E toda vez que fixo meu olhar nEle, minhas insatisfações se dissolvem. 

Naquela tarde, no jardim, eu decidi manter os meus olhos nEle e deixar que a beleza das flores que estava vendo me falasse do seu cuidado já dispensado a mim. Quando me levantei para trabalhar naquele fim de tarde, dei minha última olhada para o jardim, e fiquei ainda mais encantada com a beleza que eu vi.

Roseli de Araújo 

Escritora e Psicóloga

Referência:

1. Mateus 6:22

 

 

sexta-feira, maio 24, 2024

 




Naquela manhã de domingo, no fim da atividade com as crianças, uma menina chegou bem pertinho de mim e baixinho disse: ‘Tia, eu não gosto do meu pai, ele é cachaceiro’. Surpreendida por sua declaração, passei os braços em volta dela e respondi que iria orar para que o papai deixasse de beber. Também, prometi que visitaria a sua casa. Ela assentiu com seus olhos tristes e foi embora.

Meu coração apertado ficou. Nossas crianças estão sofrendo. Os campos brancos para ceifa, estão tão perto de nós como aquela menina esteve de mim.

Mas, parece que não queremos erguer os olhos. Ver pode incomodar. Ver pode nos trazer compaixão. Ver pode nos fazer querer ser a resposta.

Em meio à minha angústia, lembrei de Isaías. Creio que ele viu os campos quando Deus perguntou a quem enviaria. Ele quis ir. Ele entendeu a grandeza da missão. Ele não deu desculpas do tempo, do trabalho, da família, dos projetos pessoais. Ele se dispôs a deixar a sua agenda. Ele quis ser a resposta para sua geração. Ele não tinha toda a revelação que já temos do reino, mas, com o que sabia, compreendeu que valia a pena perder a vida por amor ao seu Senhor.

Hoje, perdemos a noção de quem é o Senhor. Falamos que é Jesus quem manda, contudo, vivemos a vida que queremos, e não a que Ele propôs em sua palavra. E ainda nos enganamos, pensando que Ele aceita que vivamos de cabeça baixa, olhando só para o nosso campo...

A verdade, é que muitas crianças seguem como aquela menina de olhos tristes, esperando que a igreja se levante e leve a única palavra que pode dar esperança. E Jesus, não nos aceitará de mãos vazias.

Roseli de Araújo

Escritora e Psicóloga clínica

 

 

sexta-feira, maio 17, 2024

As pessoas têm inveja de mim?

 


Este é um assunto que não penso muito. Na verdade, gosto da minha vida, porém, sei que ela é muito simples, e não parece fazer sentido que alguém tenha inveja da forma que vivo.

Mas, conheço pessoas que tem receio da inveja. Elas não contam nada para ninguém, por medo que alguém as inveje, e seus planos sejam destruídos. Respeito quem pensa assim, porém, eu não creio nisso.

Diz um grande historiador que a inveja é um pecado envergonhado, logo, ninguém confessa que sente do outro. Na minha observação, nos meios em que convivo, percebo ser uma verdade, pois nunca ouvi alguém admitir que sentiu inveja de alguém. Eu mesma, nunca achei que senti.

Pensando sobre a inveja, cheguei à conclusão que o conceito não era muito claro para mim. Então, fui estudar. Fiquei assombrada com a quantidade de material sobre o assunto. Dentre eles, gostei deste resumo: todas às vezes que nos comparamos com alguém e nos sentimos diminuídos, a inveja ocorre. Também, ela é uma dor que nasce quando olhamos para a nossa vida e sentimos que algo está nos faltando.

Uau! Pensando apenas neste resumo... E lembrando-me de Eva que tinha tudo no Éden e ainda caiu no conto da serpente que algo lhe faltava... Senti um nó na garganta.

Sempre acho difícil avaliar a mim mesma. Dói mais do que avaliar outras pessoas. Contudo, cheguei à conclusão que, com a comparação, não tenho muito problema, já estou numa fase da vida em que sei que só posso me avaliar a partir da minha própria história. Mas, quanto ao que falta, vi que por vezes sinto dor, por não ter condição de fazer o que acho que seria necessário. Fiquei chateada. Que descoberta desagradável! Eu, que pensava não sentir nenhuma inveja.

Buscando direção para saber o que fazer com que descobri, voltei meus olhos novamente para o Gênesis, na busca de entender o que ocorreu com Eva, ao comer do único fruto, não permitido no Jardim.

Fiquei me perguntando como alguém com a vida perfeita e plena de alegria, morando num belo jardim, visitado por Deus no fim do dia e sem problema de relacionamento com Adão, deseja a única coisa que não pode ter? Como não foi capaz de avaliar que em sua vida nada faltava?

Sei que somos guardados por mistérios e só conheceremos como somos conhecidos, no futuro. Todavia, o texto traz uma verdade bem clara. A serpente em sua estratégia levou Eva a tirar os olhos de Deus, e voltar o seu olhar, para si mesma. Neste instante, desejou a única coisa que não tinha (e jamais poderia ter), o ser igual a Deus. E ao desobedecer comendo do fruto, é como se dissesse para Deus que tudo que recebeu não era tão bom assim, e, que tinha o direito de ser igual a Deus. Ao pensar assim, deixou de dar glória a Deus, propósito para o qual foi criada. Neste instante, creio, nasceu a inveja.

Que tragédia!!!

Por alguns momentos, minha alma ficou perturbada... Fui me dando conta que todas às vezes que eu volto os olhos para mim e vejo o que me falta, desejo o que não tenho, e alimento a inveja que já vive dentro de mim. E quando isso ocorre, sem temor, e nem sempre com palavras, falo para Deus que desconsidero o dom da vida, a saúde que tenho, a minha imagem no espelho, os recursos e trabalhos, as pessoas ao meu lado.

Que perigo! A inveja tem raiz profunda.

O escritor de Eclesiastes tem razão, “a inveja é a podridão dos ossos”2, porque me faz focar no que não tenho. Ela tem o poder de tirar os meus olhos de todo o bem recebido. Sem ver o que já tenho, deixo de louvar e agradecer a Deus, tornando-me amarga. E ao carregar o fardo da amargura, cala em mim, toda glória devida a Deus. Neste instante, deixo de cumprir o propósito para o qual fui criada.

Que tragédia!!!

Descubro que dar glória a Deus não é apenas falar algumas palavras de louvor em uma oração. É mais profundo. É uma postura diante da vida. É me dar conta que tenho muito mais que julgo merecer. É crer de verdade que não tenho, diante dEle, nenhum direito para reivindicar.

O caminho não me parece fácil. 

Todavia, percebo que viver sem dar glória a Deus é ficar e manter-me doente em todas as dimensões da vida. Meu coração não encontra âncoras. Sem a clareza do cuidado pleno de Deus em minha vida, sou capaz de mergulhar fundo nas águas da ansiedade e angústia. E até mesmo, o mais leve vento, pode abalar-me.

Então, decido que vale a pena a jornada na certeza que Deus fez tudo certo. Nada está atrasado. Mesmo agora, fora do jardim e vivendo os embates das relações humanas, Deus em Cristo, me abençoa com toda sorte de bênçãos3, e, me permite entrar em Sua Presença, onde pode posso buscar todo suprimento para a falta que o pecado gerou mim4.

Quanta graça. É mesmo um rio de águas vivas, a trazer o jardim de volta, por onde corre dentro de mim.

Roseli de Araújo

Escritora e Psicóloga

Referência bíblicas:

1. Gênesis 3;

2. Provérbios 14:30;

3. Efésios 1:3;

4. Hebreus 4:16.

quarta-feira, maio 08, 2024

É difícil ficar numa rua sem saída

 


Você já conviveu com uma pessoa que te faz sentir que está numa rua sem saída? E ainda que disponha de tudo o que está ao seu alcance, ela nada aceita. Você vê as soluções, mas, ela resiste com toda a força a tudo que pode ajudá-la. E mesmo sofrendo, se apega às suas escolhas, como se fosse a causa de sua vida.

Quem está do lado fica com a sensação que a morte as espreita... Ela parece beber do veneno do suicídio em doses homeopáticas. E como é difícil respeitar, nela, o acelerar a morte... Não é fácil compreender o que as faz resistir, ao que lhes daria alívio.

Por vezes, queremos salvá-las. Logo, descobrimos que a missão é impossível. Sem conseguir, muitas pessoas, desesperam. Outras tantas adoecem junto. Não é fácil não ver luz no fim do túnel.

Por vezes, a raiva brota. A teimosia de quem não quer ajuda, não nos poupa de problemas que poderiam ser evitados ou minimizados. E nos vemos muitas vezes forçados a andar com os pés quebrados. Meu Deus, como dói cada passo.

Fico tentada a pensar que, quando uma pessoa decide por caminhos de morte, o que mais as motiva é o egoísmo na sua dimensão mais profunda. Pergunto: Ela deixou de amar aqueles que estenderam suas mãos na sua direção? Ela não considera tudo o que está sendo feito? Não entendo. O egoísmo tira a visão de quem está do lado. E não ser visto, é não ser amado, e sem amor a vida fica tão sem beleza...

Será que nos resta apenas sentar no meio-fio, nesta rua sem saída, sob o peso do cansaço da impotência?

Não! Graças a Deus, não!

Jesus nos convida, nesta rua sem saída, a olhar para cima (Mateus 6:28,29). Quem olha para cima verá o estilista da esperança. Aquele que veste os lírios dos campos com as mais finas roupas. E das ruas sem saídas, Ele faz seu ateliê, nos tornando, dia a dia, mais parecidos com Jesus. Quanta beleza!

Também, Jesus entende o que é morrer por quem só escolhe o pior. Ele voluntariamente se entregou por mim e você. Ele nos ensina que o peso de tentar entender as pessoas é maior do que o peso de simplesmente amá-las.

Que Ele nos ajude.

Roseli de Araújo 

Escritora e Psicóloga

quarta-feira, maio 01, 2024

Um amigo preso, mas livre. Como?

https://www.jusbrasil.com.br/artigos/voce-ja-foi-a-um-presidio-um-relato-da-minha-primeira-experiencia-em-um-presidio/311734612


Tenho um amigo, que vou chamar de António, nome fictício, que foi preso sem ter cometido o crime o qual foi acusado. Foi absolvido na primeira instância por falta de provas. Porém, o advogado de acusação recorreu, e o seu advogado perdeu o tempo da defesa, e ele foi sentenciado a mais de 9 anos de prisão.

Ao saber vivi um misto de raiva e tristeza pela injustiça. Pois, de todos os ambientes que julgo terrível, presídio me parece um dos mais tenebrosos.

Um dia orando pela sua vida e de sua esposa, senti em meu coração que deveria escrever para ele. E assim fiz. Ele me respondeu por meio da sua esposa. 

Ao ler sua carta fiquei surpreendida e, ao mesmo tempo, envergonhada. Pensei que encontraria alguém amargurado e emocionalmente quebrado. Mas, veja o que ele me respondeu: 

'Como amei sua carta, é como degustar de uma comida refinada que alimenta a alma... E as palavras são como abraços que faz sentir o afeto e o carinho de uma amizade tão sincera que constrange o coração. Poder me comunicar com você e seu marido é um privilégio incomparável. Aqui o deserto de afeto e carinho é tão grande que receber uma carta, uma visita, tem grande significado, que não tenho palavras para expressar. Aqui é Deus que faz a diferença cada dia me fortalecendo para enfrentar o dia a dia e vencer, sem desfalecer na alma. Sei que tudo isso vai passar, e só vai restar o testemunho dos cuidados de Deus. Depois de tudo que vivi com Deus e presenciei, a minha fé está firmada e minha alma convicta que no final é vitória em nome de Jesus Cristo. E todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus e são chamados segundo o seu propósito. E os propósitos de Deus são sempre para melhor e nunca para pior, ainda que hoje não entendemos, o amanhã vai trazer clareza, e vamos glorificar a Deus´.

Meus queridos amigos, estas são as palavras de um homem preso injustamente.

Ele segue: `As palavras que eu falo não são palavras ao vento, mas que sai do coração. O salmista diz no salmo 45 que de boas palavras transborda o meu coração e a minha língua é a pena de um habilidoso escritor. E a bíblia diz que a boca fala do que o coração está cheio. Minha irmã, em breve estaremos juntos, para glória de Deus.  Que Deus abençoe você e seu marido e continue acrescentando em suas vidas. A única coisa que eu posso falar é gratidão. A minha saúde esta estável e estou passando por um cardiologista que é muito bom, e esta me dando toda atenção. O pior já passou, em nome de Jesus estou caminhando para vitória e reta final`. Ao finalizar a carta me pediu para dar atenção para sua esposa.

Sua esposa me contou que ele não para de pregar no presídio. Lá, tem ganhado muitos homens para Jesus. 

Fico muito impressionada com sua postura. Ele não se sente vítima, mesmo sendo. Ele compreendeu quem é o Senhor da sua vida. Ele creu na soberania divina. E seu coração encontrou descanso em Deus.

Ao terminar de ler sua carta fiquei constrangida. Ela expôs minha fé. No primeiro momento, eu quis acreditar que Deus escolhe gente para ser mais espiritual. Mas, sei que isso não é verdade. A Palavra e o Espírito Santo foram dados a igreja - eu e você - que cremos em Jesus.

Somos nós que não vivemos a radicalidade da nossa fé, porque preferimos viver um evangelho customizado (customizar é fazer com que algo fique do jeito que a gente deseja). Um evangelho que obedecemos só o que nos interessa. Um evangelho de orações onde nossa busca é obter de Deus, o favor. Um evangelho sem cruz, onde não abrimos não de nada para servirmos ao Senhor, e ainda apresentamos nossas desculpas do trabalho, da família, e de tantas outras coisas... Hoje não temos tempo nem para ler a Palavra e a oração sempre pode esperar, (nem mesmo no domingo, nosso dia reservado para o Senhor).

E por isto, quando o sofrimento chega a nós, reclamamos. Ficamos ressentidos com o não de Deus. Falamos que Jesus é o Senhor, mas, por Ele, queremos ser o tempo todo servidos...

E por isto, nossa alma está sobrecarregada, ainda que Ele nos convide a vir até ele, para aprendermos a ter coração manso e humilde, e assim encontrarmos descanso para nossa alma. Nós preferimos carregar o fardo de termos direitos e do orgulho.

Li e reli sua carta. E minha conclusão é que meu amigo que está preso esta muito mais livre que eu e muitos irmãos amargurados e cansados que cruzo pelo caminho.

O meu amigo se rendeu ao Salvador e Senhor da sua vida. Ele desfruta de uma riqueza que riqueza nenhuma pode comprar. Ele tem paz e descanso. Suas cadeias não foram capazes de torná-lo, mais ou menos feliz. Ele descobriu que a paz e alegria não está na sua liberdade, no seu casamento, nos seus filhos, no seu trabalho, nos seus amigos, nos seus estudos. Ele compreendeu que tudo que precisa está tão somente em Deus.

Meu amigo preso esta livre como eu desejo esta.

E você?

Roseli de Araújo

Escritora e Psicóloga clínica

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