Naquela casa havia espelho, mas ninguém ousava vê-los.
E na falta de brilho da solidão dos olhares, era possível ver
que não havia nenhum dividir do pão.
Contudo, os espelhos estavam por toda parte.
Na sala a TV ligada para preencher a conversa que não se
fazia.
No quarto, o sono
inventado para não ser tocado e nem incomodado, ou a dor de cabeça que não se pode
medir, mas que na insistência da sua presença, mostra qual é a sua régua.
Na varanda, a cadeira de corda, a rede, sempre vazia. É que
naquela casa não havia nenhum espaço para os outros, ela já estava preenchida
pelo eu dos seus habitantes.
Na cozinha, o sentar à mesa já não era bem vindo, sendo
preferido não comer por medo de engasgar com a indiferença sempre posta sobre a
mesa.
O banheiro, um escape, para viver a solidão sozinho.
Na garagem, um carro, uma esperança... sair era o que
mantinha aquela convivência.
Mas, naquela casa havia espelhos, e ninguém se inquietava do
fato de que ninguém os olhavam.
Eles. os espelhos, se falassem, gritavam, ‘Vejam, vejam,
vejam, a morte ronda, salve a casa’.
Mas o medo os dominavam, era melhor apontar o outro do que se
ver no espelho... e assim a morte já reinava... o perdão já se despedira, a
educação se perdeu no ralo do “to nem ai”, e a conversa que um dia fora leve,
pesada ficou, até que o silêncio se impôs, na construção de muralhas...
Os espelhos mostravam o que precisava ser visto, e revisto,
retocado... mas ninguém se sentiu responsável... e sozinho ficou a mostrar o
que não era bem visto.
Naquela casa, um dia houve sorrisos. E os espelhos eram
amados. Porém, o tempo dos eventos que ventos fortes trouxeram desorganizou aquela
casa... e nenhum móvel podia ser mantido como era... que pena! Nasceu bonita,
cheia de vida, prometia ser bela, mas se tornou escombros... sem possibilidade de florescer de novo...
Os espelhos foram ignorados, e até a bruxa da branca de neve tratou o seu espelho melhor do que eles... Naquela casa, os espelhos, nem foram consultados, ‘espelho
,espelho meu quem é mais belo do que eu’? Os moradores não queriam saber da
beleza do outro, se perderam como Narciso.
Mas os espelhos naquela casa continuam. Estão sujos pelo
desprezo dos que passam por eles, mas estão lá, e quem sabe um dia, a vida volte
a correr naquela casa, e a morte deixe de lá rondar.
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