Ele chegou arrastando seu cansaço. Suas roupas
maltrapilhas indicavam de onde não vinha. Sua casa a muito fora perdida. Ele
não soube contar o exato momento, contudo se lembrava com saudade do tempo que suas
paredes e tetos o aqueciam.
Em sua bagagem um cobertor puído, mas, andava encurvado com o peso de
tudo que perdeu. Sentou-se a minha frente, e procurei ver os seus olhos, mas ele cabisbaixo se mantinha. O tempo passou rápido para mim. Considerei que para ele talvez fosse uma eternidade. Ao erguer finalmente os olhos, vi a tristeza que o seu coração carregava, e assustei. Não imaginava que alguém pudesse trazer no olhar tamanha
ferida, e me perguntei, cicatrizaria algum dia?
Assim, tentando esconder-me na postura profissional, seguir fazendo as
perguntas de sempre. Ele respondeu com voz fraca, quase inaudível, tentando
ainda manter em seu peito a esperança que brigava para ir embora.
Naquele momento me vi em seu lugar, e o meu peito apertado ficou. Perguntei a mim mesma, ‘o que gostaria de ouvir de alguém que me
atendesse se estivesse nessas condições’?
Balancei a cabeça me chamando a atenção. Eu já havia aprendido que cada ser humano tem sua própria forma de lidar
com suas dores. E fiquei travando uma luta invisível de tentar descobrir o que
fazer para amenizar a dor daquele homem. Quando me dei conta que estava perdendo-o. Ele
estava ali. Tudo que precisava era de ser visto por mim. Tudo que urgentemente
necessitava era de ser ouvido após sua longa jornada cheia de monólogos sem platéia.
Ele falou por minutos. E na medida em que falava sua força retornava. Era como se o peso que o encurvou fosse lançado para fora daquela sala que nos abrigava.
O relógio me acenou que seu tempo havia terminado,
contudo permaneci ouvindo-o. Sua necessidade era pungente de falar, falar e
falar... Naquele momento era isso que ele
precisava. Vi seus lábios acenarem um sorriso pálido enquanto chegava no final das suas
palavras. Sorri largamente dentro de mim porque me parecia impossível no início daquela sessão ver qualquer esboço de alegria. Senti-me com
o dever cumprido.
Ele me disse, ‘o que a senhora fez comigo? Aqui falei coisas que nunca
disse a ninguém’. Continuei sorrindo. Fiz apenas o que devia ser feito. Abandonei a ideia
de ser deus, para ver o humano que estava diante de mim.
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