sábado, dezembro 16, 2017

Tem hora certa para seguir o fluxo do rio

"Se a gente não aceitar a gente desaba", disse seu Leonel, um querido senhor que conheci,  ao perder sua esposa. 
Acredito que se a morte é a pauta discutida, não me parece ter outro caminho, se queremos dela recuperar. 
O que me inquieta não é a morte. Ela se impõe soberana. Mas, aquelas situações trazidas pela vida, a exigir todas as forças que temos para solucionar. Aquelas que seguir lutando é preciso, porque tememos que desistir nos traga uma dor que não saberemos lidar. 
Como saber o momento de parar, sentar, contemplar e aceitar simplesmente o fluxo do rio?
Aceitar a vida como ela é me parece tarefa contra cultura. Somos ensinados que viver exige luta, conquista e empreendedorismo.
Contudo, saber a resposta para esta pergunta é encontrar a sabedoria tão necessária, pois dela depende o descanso da nossa alma, o qual, torna a vida sustentável.
Aprendi que desistir é diferente de aceitar
Desistir é não tentar mais, depois de um tempo de luta, em que ainda temos armas e possibilidades para vencer. 
Aceitar é compreender que as armas em punho não foram suficientes, e as forças se esvaíram. É perceber o limite do cansaço que nos arrasta para o precipício do desespero, nos levando ao  abismo do desequilíbrio. É render-se as portas revestidas de muros que se ergueram, impedindo toda e qualquer possibilidade de serem abertas. 
Desistir pode ser fácil, mas aceitar é tarefa árdua quando se lutou com tanto afinco. 
Roberto Carlos e Eramos já disse que "é preciso saber viver". E como lição que não se pode pular, aceitar faz parte deste saber.
Lembro-me da amputação que minha mãe teve sofrer na perna esquerda. Por cinco anos lutamos, fizemos tudo o que era possível. E a cada tentativa uma derrota, até que o médico decidiu amputar. 
Eu estava extremamente cansada de lidar com o convênio, das idas e vindas aos hospitais, do esforço para manter o remédio, de ver seu sofrimento sem trégua. Contudo, teria lutado mais se fosse considerar o desejo da minha alma. Mas, era hora de parar. A tristeza me tomou por dias, mas provei do descanso para o coração ferido, ao aceitar as soluções que a vida trouxe. 
O tempo passou. 
Hoje, vendo minha mãe sem dores, embora sem parte da perna, sou grata por ter aceitado o fluxo do rio.
Aprendi que é hora de parar quando já se fez tudo que podia. Quando anos de lutas já sinalizaram o cansaço dos nãos.
É preciso deixar o fluxo do rio a correr, quando, toda tentativa possível, frustrada foi em seu intento.
Gosto de pensar que Deus só nos cobrará aquilo que está em nossas mãos para fazer. A Moisés era erguer o cajado, abrir o mar vermelho só Ele podia. 
Porém, tantas vezes queremos abrir os mares da nossa vida com a força dos nossos "cajados". Não tem jeito. Se Ele não quiser abrir, e a "gente não aceitar, é certo, a gente desaba". 
Seu Leonel tinha toda razão.



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