Ele era apenas mais um leproso. Como ele, existia muitos
vivendo as margens das cidades, proibidos do contato com outras pessoas. Abandonados sem nenhum direito à cuidados,
viviam isolados do conforto do toque, do cafuné, dos abraços apertados e da
doçura do beijo.
A religião propagava que a benção de Deus não estava com
quem tem lepra. Eles eram pecadores sem perdão. Humanos de segunda categoria.
Gente como os pedófilos nas cadeias, que só sobrevivem isolados.
Vistos como seres
amaldiçoados por Deus, eram temidos como a pior peste. Ter lepra era mais
isolador do que ter covid-19.
Mas, o leproso de Marcos 1:40 ao ouvir falar de Jesus, tem
acesa em seu coração a fé e a esperança de dias melhores. Tal sentimento quando
surge dá força. Levando o leproso a ficar à espreita, à margem da estrada na
expectativa de ver Jesus. Ao avistá-lo, eu o imagino lutando por alguns
instantes com os monstros do isolamento e da rejeição cravados em sua alma, porém,
a fé que nasceu o movimenta.
Jesus o vê se achegando. Ele não se move do lugar. O
leproso chega tão perto que ao estender a mão, Jesus o toca. Os discípulos que
estão ao seu lado levam a mão na cabeça, “como o leproso ousa a se aproximar e
como Jesus se atreve a tocá-lo?” A lei não permite tocar leprosos. O silêncio
do assombro os toma.
Mas, Jesus está comovido pela compaixão. Algo no jeito deste
leproso mexe com seu coração. Ele diz a este leproso, ‘Eu quero curá-lo’, e o
cura.
Agora, vendo Jesus em Marcos eu fico desconfortável... A
compaixão de Jesus é diferente... Não é um discurso distante do doente, não é
apenas o desejo de ajudar, não é a fala bonita daquele que diz, “se um dia eu
ganhar na mega sena, vou construir um orfanato ou asilo”. A compaixão de Jesus
é ação - mão estendida.
A compaixão de Jesus explode as muralhas culturais e
religiosas construídas ao longo de milhares de anos, permitindo ao leproso a
entrada na cidade, no templo, em casa.
A compaixão de Jesus não busca os holofotes da fama. Ele
entende bem o perigo da publicidade. Sabe que a mesma propaganda que o torna
conhecido, pode se tornar impedimento para cumprir sua agenda. Diante disso, avisa
o leproso para não o anunciar. O leproso curado não consegue obedecê-lo. Sai a
dizer, “Jesus me curou”.
Como Jesus previu, sua desobediência prejudica sua agenda. Mesmo sabendo disso, Jesus não deixa de
curá-lo. Não fica a reclamar por não entrar nas cidades.
E a compaixão que o fez perder sua agenda, dá a Ele uma
nova. E mesmo em lugares desabitados, Jesus, atraiu para si pessoas de todas as
partes. Elas vão ao seu encontro desejando serem tocadas por aquelas mãos que
não temeu tocar um leproso.
O mundo segue cheio de leprosos. Mas, carece da compaixão de Jesus que vê mais o doente do que a doença, que toca quem está na solidão a margem da estrada e se dispõe a perder agenda para abençoar.
Vendo Jesus em Marcos, eu me vejo com muito pouca compaixão-ação. Sinto vergonha deste Jesus de mão estendida. Então, clamo, “Jesus me dá desta sua compaixão”.
E você?
Roseli de Araújo
Escritora e Psicóloga clínica.
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